O IMAGINÁRIO EUROPEU, AS VISÕES SOBRE O “NOVO MUNDO” E SUAS GENTES.
Nos séculos XV e XVI, quando ocorreram as grandes viagens marítimas, os europeus se depararam com realidades que eram bastante estranhas para eles. O oceano era um lugar onde reinava o imprevisível, ou seja, os navegadores não tinham certeza do que poderia acontecer, nem do que poderiam encontrar pelo caminho. As informações que eles tinham haviam sido retiradas, em sua maioria, de livros de outros navegadores, como por exemplo Nicollo Matteo, Marco Pólo, etc. Mas tais informações eram povoadas de mitos e superstições. Assim, ao partirem para as grandes viagens pelo oceano, os navegadores tinham em mente as informações de livros sobreviagens e também suas próprias crenças e mitos, que desde a Antiguidade povoavam seus pensamentos.
Essa informações míticas e supersticiosas pertenciam quase todas à tradição grega: Ctésias de Cnido em 398 antes de Cristo, já escrevia sobre a existência de raças fantásticas como os ciápo das que possuíam um único e grande pé, os homens peludos,sem cabeça, e que tinham os olhos nos ombros, etc; Plínio, em 77 depois de Cristo,também escrevia sobre os monstros e maravilhas que foram avistadas na Índia, como seres antropófagos (que comiam carne humana), seres andrógenos (que possuíam os dois sexos), etc.
E tais informações foram sendo adaptadas ao longo do tempo. Porém, em geral,mantiveram-se quase sem alterações até o século XVI. Dessa forma pode-se entender o fato de os navegadores europeus terem visto sereias, antípodas (criaturas com os pés virados para trás), cinocéfalos (criaturas com corpo humano e cabeça de cachorro que comiam carne humana), ciclopes (monstro caracterizado por ter um único olho no meio da testa), e outras tantas criaturas monstruosas e maravilhosas, quando viajaram por regiões desconhecidas.
Nessa imagem estão retratados alguns monstros que os europeus (sobretudo os portugueses e espanhóis)acreditavam existir. Até os séculos XV e XVI, quando ocorreram as grandes viagens marítimas, acreditava-se que esses monstros habitavam a região das Índias.Porém, a medida que os navegadores foram chegando atais regiões e desmistificando-as, passaram a acreditar que as criaturas monstruosas estavam em outras terras que ainda eram desconhecidas. Dessa forma o oceano Atlântico e o “Novo Mundo”, ou o Continente Americano,passaram a ser o reduto onde habitavam esses monstros.
O imaginário, ou seja, o conjunto das ideias e imagens que faziam parte da mentalidade dos europeus, foi projetado sobre aquilo que eles viram de diferente durante as viagens pelo mar, e também ao entrarem em contato com terras desconhecidas. Dessa forma, quando eles chegaram às terras que mais tarde chamaram de Continente Americano, tudo aquilo que havia de exuberante ou de estranho foi identificado com as imagens que já lhes eram familiares. Aquilo que já fazia parte do pensamento cotidiano dos europeus projetou-se sobre a realidade que estava diante deles e, dessa forma, eles puderam entendê-la. Foi por causa desse tipo de identificação que os europeus viram no “Novo Mundo” vários monstros e criaturas fantásticas e maravilhosas.
O Ciclope, monstro caracterizado por ter um só olho no centro datesta3. As sereias são monstros marinhos que têm sua origem na tradição grega, e que foram identificadas, por exemplo, com a criatura denominada Ipupiara, encontrada nas brasileiras.
Foi também por causa dessa identificação que os europeus acreditaram ter chegado ao Paraíso Terrestre (que era o lugar onde se encontrava o estado original do mundo, ou seja,onde se encontravam a ausência do pecado original, a pureza e a liberdade). A natureza exuberante e os bons ares eram características que contribuíam para que o “Novo Mundo” fosse associado ao Paraíso. Comparando-se as características das novas terras com as paradisíacas e encontrando semelhanças entre elas, os europeus logo fizeram uma associação. Dessa forma, ficava mais fácil entendera existência dessas novas terras. Mas o Paraíso nem sempre foi identificado com o Novo Mundo. Ele migrava de uma região para outra, conforme os europeus iam descobrindo e conhecendo lugares novos: ele esteve no oriente, no meio do oceano, no Novo mundo etc.
Se existia a ideia de Paraíso, existia também a ideia de inferno entre os europeus contemporâneos ao período das grandes viagens marítimas. Eles eram homens profundamente religiosos e seus pensamentos eram marcados por uma constante luta entre o bem e o mal. Dessa forma, no Novo Continente não foram identificadas apenas características paradisíacas, como a vegetação exuberante, por exemplo, mas também demoníacas, os inúmeros insetos e animais peçonhentos, o forte calor e, principalmente, os costumes das gentes da terra, ou seja, dos indígenas.
Os indígenas foram também relacionados com seres que estavam presentes no imaginário dos europeus: suas características assemelhavam-se às dos “homens selvagens” que habitavam livremente os bosques, gozando de liberdade e vivendo com base em seus instintos. Todas essas características eram contrárias ao ser humano cavalheiro e cristão que os europeus tinham como modelo. Os rituais dos indígenas, suas danças, sua nudez, suas práticas sexuais, sua preguiça, seus deuses, suas práticas religiosas, foram vistos pelos europeus como ações demoníacas, sobretudo o ritual antropofágico, no qual se comia a carne humana.
Contudo, deve-se ter em mente que essas características que se atribuíam aos indígenas têm uma razão de ser, pois aqueles que escreviam sobre o modo de viver do índios tinham uma visão centrada na religiosidade e nos padrões de vida europeus.Além disso, a identificação do que existia no imaginário europeu com a realidade contribuiu para que o diferente não fosse visto realmente como era, mas sim filtrado por algo que já era conhecido e comum.
Dessa forma, pode-se perceber que os europeus não viram os indígenas como seres humanos com um modo de vida diferenciado, mas identificaram-nos com os “homens selvagens”, desclassificando seus costumes e hábitos. E, do ponto de vista espiritual, os europeus consideraram as práticas indígenas demoníacas, identificando suas ações religiosas com bruxaria, feitiçaria e outros tantos rituais anticristãos, que já faziam parte de sua mentalidade. Assim, eles conseguiram dar sentido à existência de seres humanos em uma região que, com base nas informações que tinham, não podia só podia ser habitada por monstros e criaturas maravilhosas.
Pode-se, por fim, concluir que a visão que os europeus tiveram do Novo Mundo e das gentes que o habitavam estava fundamentada no imaginário europeu que era marcado pela religiosidade e pela crença em uma série de mitos e superstições. Todas as imagens que permeavam o pensamento dos europeus, entre os séculos XV e XVI,acabaram sendo associadas à realidade do Novo mundo, de forma que ele pudesse ser entendido. Assim, as ideias de bem e mal, de Paraíso e Inferno, conduziram a visão que foi lançada sobre as novas terras e aqueles que a habitavam, ora edenizando-os, ora detratando-os.
As impressões dos Europeus
No século XVI, diversos viajantes europeus estiveram no Brasil e registraram suas impressões. Escreveram basicamente depoimentos e relatos de viagem que tinham por objetivo apresentar aos compatriotas um panorama do Novo Mundo. Concebidos sob a forma de cartas, tratados, diários e crônicas, esses textos são conhecidos como literatura de informação.
Os primeiros registros escritos do Brasil têm como característica a documentação do processo colonizador que marcou os primeiros anos de povoamento. São informações que viajantes e missionários europeus anotaram sobre o homem e a natureza das terras que conheciam naquele contexto.
Paralelamente às obras de informação escritas por leigos viajantes que desbravavam a colônia, foram produzidas, também, obras de cunho pedagógico e moral, a chamada literatura de formação ou de catequese, produzida pelos missionários jesuítas. Vindos de Portugal, esses religiosos, que tinham a missão de catequizar os índios, deixaram cartas, tratados, crônicas e poemas, os quais se tornaram registros não só de uma prática religiosa de difusão do catolicismo, mas também registros de textos com um certo refinamento estético.
Nas cartas que escreveu a Portugal, encontra-se a descrição do início do povoamento das terras brasileiras. Além disso, como catequizador, seus escritos contribuíram para o estudo dos costumes da sociedade indígena tupinambá. Em sua primeira carta do Brasil, ao padre Simão Rodrigues, provincial em Portugal, expressa uma postura típica dos jesuítas a respeito da conversão do indígena e a tentativa de eliminar de sua cultura certos hábitos, como o canibalismo e a poligamia.
De Pero Vaz de Caminha detalhado relato feito pelo escrivão da frota de Pedro Alvares Cabral ao rei D. Manuel da descoberta de uma nova terra no qual narra as primeiras impressões sobre a costa descoberta bem como dos seus nativos, além de uma série de outras observações sobre o clima, a paisagem e as potencialidades gerais do que fora encontrado.
Indicado por Calvino para vir ao Brasil, Léry aqui chegou na companhia de 13 outros pastores huguenotes que vieram irmanar-se na colônia fundada por Villegagnon na baia da Guanabara. Sua aproximação com os tupinambás terminou por render o melhor ensaio etnográfico sobre os indígenas do Brasil.
As cartas enviadas pelo padre Manoel da Nóbrega aos padres-mestres da Companhia de Jesus, ao Provincial, que ficaram na Europa e que servem como testemunho vivo do processo de ocupação do novo território, bem como das dificuldades da catequese aqui encontradas pelos jesuítas na conversão dos Gentios, assim como uma exposição detalhada dos 'pecados da terra', isto é, os costumes dos indígenas reprovados pelos padres.
A escravidão na África e a expansão Marítima
O comércio de escravos existiu na África desde a antiguidade, porém o número de escravos acentuou-se na Idade Moderna.
A fonte de escravo era a guerra, com os prisioneiros sendo posto a trabalhar ou sendo vendidos pelos vencedores. Outros motivos também levavam a escravidão como a condenação por transgressões e crimes cometidos, ou endividados impossibilitados de pagar dividas, ou mesmo por não ter condições de sobreviver independentemente. A escravidão existiu em muitas sociedades africanas bem antes dos europeus começarem a traficar escravos pelo oceano atlântico.
O tráfico transatlântico de escravos desenvolveu-se em parte com a participação dos próprios africanos, ou seja, os africanos participaram ativamente dessa atividade.
Poucas foram as iniciativas dos portugueses em colonizar a África, já que saciavam seus interesses mercantis mantendo uma relação amigável com povos do litoral. As regiões das quais a maior quantidade de africanos foi trazida para o Brasil foram Senegâmbia (Guiné), durante o século XVI, Angola e Congo, durante o século XVII, e Costa da Mina e Benin, durante o século XVIII. Durante o século XIX, os ingleses proibiram o Brasil de traficar africanos de locais acima da linha do Equador.
A expansão marítima e comercial europeia, a partir do século XV, mudou a história da humanidade ao unir três continentes, a Europa, a África e a América. Depois que alcançaram o litoral atlântico da África, os portugueses conseguiram ter acesso ao comércio de seres humanos que já era praticado pelos africanos.
TRÁFICO NEGREIRO
O tráfico negreiro representa a fase em que os negros africanos foram trazidos para a América.
O
comércio de escravos negros africanos foi uma das principais atividades
comerciais dos países dominantes no período de 1501 a 1867.
Comércio África-América
A prática era gerenciada por seis nações: Inglaterra, Portugal, França, Espanha, Países Baixos e Dinamarca.
A justificativa comercial para sustentar a exploração de escravos africanos era que somente com os escravos seria possível manter os baixos preços de produtos como açúcar, arroz, café, anil, fumo, metais e pedras preciosas.
Esta prática comercial da escravidão se constituiu no mais importante objetivo de interação entre europeus e africanos, antes afastados pelo poderio do mar.
A descoberta do Novo Mundo possibilitou a ampliação da produção de diversos produtos requisitados pela Europa, contudo, a mão de obra disponível era insuficiente.
A explicação para o uso da mão de obra africana forçada nas colônias é alvo de diversas correntes de pesquisas históricas.
A escravidão no Novo Mundo e os tipos de comércio a que deu origem surgiram como uma consequência e um componente da “ globalização”, fase da história humana inaugurada pelas explorações marítimas, comerciais e colônias de Portugal e Espanha, no final do século XV e no início do século XVI.
Ação de institucionalizar a escravidão é devido a expansão de uma economia mercantil global centrada na Europa e em suas demandas por matérias-primas e produtos tropicais de alto valor.
No início justificava-se que os negros eram inferiores, que haviam perdido uma guerra e assim poderia ser escravizados.
Também houve a crença que o negro africano foi escravizado porque o índio não se deixou escravizar ou porque morreu de doenças trazidas pelos colonizadores.
A escravidão era uma instituição presente nas sociedades africanas, mas não tinha fins comerciais, e representava dominação e poder do mais forte sobre o fraco.
Diante dessa nova realidade, os europeus passaram a praticar o lucrativo tráfico negreiro, que aconteceu durante quatro séculos entre o continente africano e o continente americano. O tráfico negreiro ocasionou transformações na sociedade africana, pois o aumento ou a diminuição da escravidão interna (na África) estava relacionado (a) com a maior ou a menor demanda externa (para a América). Portanto, quanto maior a necessidade de escravos na América, maior era o número de pessoas escravizadas na África. Assim, o tráfico negreiro se tornou um negócio rentável.
O contingente de africanos que foram trazidos forçadamente para a América como escravos não é preciso, mas situa-se entre dez e onze milhões de africanos escravizados, desde o século XV até a abolição do tráfico negreiro em Cuba, no ano de 1868. No Brasil, o tráfico negreiro foi proibido com a Lei Eusébio de Queiroz em 1850, mas a escravidão somente foi abolida no ano de 1888.
COLONIZAÇÃO PORTUGUESA; ECONOMIA AÇUCAREIRA
A MONTAGEM DA ÁREA DE PRODUÇÃO AÇUCAREIRA
O ENGENHO COLONIAL
A grande propriedade de produção açucareira acabou assimilando a denominação de engenho, que era apenas um dos seus elementos. A propriedade englobava as terras de plantação de cana-de-açúcar, o setor agrícola da plantation, e o engenho propriamente dito, o setor fabril da plantation, responsável pela transformação da cana em açúcar. O termo plantation substitui a tradicional denominação do tripé da agricultura de exportação: latifúndio, monocultura e escravidão. O que diferencia a plantation de outras culturas agrícolas é a existência, nela, de um setor fabril para o beneficiamento do produto agrícola cultivado.
Dos engenhos uns se chamam reais, outros inferiores vulgarmente engenhocas. Os reais ganharam este apelido, por terem todas as partes, de que se compõem, e todas as oficinas perfeitas, cheias de grande número de escravos, com muitos canaviais próprios, e outros obrigados à moenda; e principalmente por terem a realeza de moerem com água, à diferença, de outros, que moem com cavalos e bois, e são menos providos e aparelhados; ou pelo menos com menor perfeição, e largueza, das oficinas necessárias, e com pouco número de escravos, para fazerem como dizem, o engenho moente e corrente”.
Escravidão no Brasil: formas de resistência
Resistência à escravidão
A
resistência dos escravos foi uma resposta à escravidão que foi uma
instituição presente na história do Brasil ao longo de mais de 300 anos.
A resistência dos
escravos tinha como grande objetivo a conquista da liberdade, mas também
poderia buscar apenas impor limites ao excesso de tirania de feitores e
senhores.
Durante todo o tempo em que foram escravizados, os negros lutaram pela sua liberdade. As formas de resistência do negro ao trabalho escravo foram as mais variadas. Revoltas, fugas, suicídios, assassinatos de seus senhores, feitiçaria, capoeira, impermeabilidade cultural foram estratégias frequentes de resistência no dia a dia do seu cativeiro. Mas, sem dúvida, foram os quilombos a estratégia de resistência mais importante. As revoltas dos escravos no período colonial, embora muitas vezes planejadas, acabaram por não acontecer, o que não impediu o medo da população branca de que alguma delas se tornasse bem-sucedida.
Revoltas violentas
As revoltas dos escravos eram, muitas vezes, voltadas contra seus senhores e feitores, podendo, inclusive, resultar na morte deles.
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Fugas
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Quilombos
Essa estrutura surgiu no Brasil, em meados do século XVI, e se popularizou depois do Quilombo dos Palmares.
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Outras formas de resistência
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No Engenho Benfica, na Bahia, os escravos do conde Subaé recusaram-se a obedecer às ordens do feitor para que realizassem a limpeza da plantação de cana. Os escravos recusaram-se a trabalhar durante três dias seguidos – mesmo sendo punidos com castigos físicos.
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No Engenho de São Bento de Inhatá, também na Bahia, os escravos rebelaram-se contra o feitor após ele exigir que trabalhassem no domingo (dia do descanso). Na confusão, um dos escravos e o feitor morreram.
Leis abolicionistas
O tráfico de escravos era essencial para atender a alta demanda por escravos no Brasil, e com a sua proibição, a tendência era que a população de escravos fosse reduzindo-se gradativamente até a abolição acontecer, uma vez que não haveria a renovação dessa. Ainda assim, os escravocratas fizeram de tudo para que essa transição fosse o mais lenta possível.
As leis abolicionistas, portanto, estão, em parte, dentro desses esforços de impedir que a abolição acontecesse de maneira imediata e irrestrita e de promover determinados avanços para conter a força do abolicionismo.
A proibição do tráfico, de toda forma, é um momento importante, pois o Brasil finalmente atendeu às pressões da Inglaterra pelo seu fim. Isso aconteceu porque os ingleses passaram a pressionar o Brasil a partir da lei Bill Aberdeen. O clima ruim entre as duas nações levantou discursos inflamados e, para evitar-se uma guerra, foi decretada a Lei Eusébio de Queirós.
A Lei Eusébio de Queirós foi aprovada em setembro de 1850, decretando a abolição do tráfico negreiro no Brasil. A lei foi acompanhada de medidas de repressão a essa atividade, fazendo com que o tráfico negreiro tenha deixado de existir efetivamente a partir de 1856. Ela foi resultado de anos de pressão dos ingleses para que o tráfico negreiro fosse extinto.
Poucos anos depois, em 1856, o tráfico de escravos africanos no Brasil havia sido zerado por meio da intensa repressão do governo contra essa atividade. Na década de 1850, o debate político foi dominado pelas questões relativas à implementação da proibição do tráfico ultramarino de escravos.
Na década de 1860, os únicos locais da América que ainda permaneciam com a utilização do trabalho escravo de africanos, além do Brasil, eram Cuba e Porto Rico. A péssima repercussão internacional disso somada às revoltas de escravos, que se multiplicavam no país, fizeram com que surgissem algumas pessoas a defender a criação de uma legislação em prol da abolição.
A ideia era realizar a transição para a abolição por meio da lei e não por meio de uma revolução (como tinha acontecido no Haiti). Essa legislação faria uma transição gradual para atender os interesses da elite econômica brasileira, e, desse debate, surgiu a primeira lei abolicionista: a Lei do Ventre Livre.
Lei do Ventre Livre
A Lei do Ventre Livre foi oficialmente aprovada em 28 de setembro de 1871. Essa lei decretava que todos os filhos de escravos nascidos no Brasil a partir de 1871 seriam considerados livres. O dono dos escravos que tivessem filhos tinha, porém, a opção de escolher quando daria a liberdade de fato a eles.
A opção tratava que o senhor de escravos poderia permanecer como tutor dos filhos de escravos até os 21 anos, e aí ele seria obrigado a libertá-los, sem receber indenização. Havia a opção também do senhor de escravos libertar os filhos de seus escravos com 8 anos de idade, e, nesse caso, ele receberia uma indenização de 600 mil-réis.
Essa lei nasceu de um estudo promovido por José Antônio Pimenta Bueno acerca da emancipação dos escravos. Após esse estudo, Pimenta Bueno propôs uma lei estabelecendo, primeiramente, a emancipação dos seus filhos. Essa proposta seguia uma tendência, que foi adotada em grande parte da América Latina, de promover a abolição gradualmente.
O estudo realizado por Pimenta Bueno foi resultado de um pedido direto do imperador D. Pedro II, mas a proposta do político não avançou e foi engavetada com por conta da Guerra do Paraguai. Depois que o conflito acabou, uma proposta nos moldes da de Pimenta Bueno foi apresentada pelo Visconde do Rio Branco.
A ideia, como já apresentado, era promover a abolição no Brasil por meio da lei e impedir que acontecesse por meio de revoltas de escravos. Naturalmente, os escravocratas não gostaram da proposta porque afirmavam que a legislação serviria de incentivo a revoltas de escravos contra seus senhores.
Os abolicionistas mais radicais também não gostavam da lei, pois defendiam que a abolição deveria acontecer de maneira irrestrita e imediata, isto é, sem transição gradual. Defendiam também a ideia de que os senhores de escravos não deveriam ser indenizados.
O grande ponto de divergência da lei, enquanto ela era debatida, foi a questão da indenização. Os escravocratas não abriam mão de ser indenizados pela liberdade dos filhos de seus escravos, e, por isso, ficou decidido que se os filhos de escravos fossem libertados aos 8 anos de idade, o senhor de escravos receberia uma indenização de 600 mil-réis.
De toda forma, quando a lei foi aprovada, decidiu-se pela libertação dos filhos dos escravos nos moldes citados. Outra determinação importante dela foi a criação de um registro nacional, no qual os senhores de escravos deveriam, obrigatoriamente, matricular todos os que tivesse sob sua propriedade. Por consequência, os escravos que não fossem matriculados seriam considerados livres.
Por meio da Lei do Ventre Livre, os abolicionistas acharam espaço para atuar energicamente na Justiça brasileira contra os senhores de escravos e, frequentemente, vasculhavam os registros atrás de irregularidades. Assim, era verificado se a idade dos escravos registrados era correta, se eles estavam de fato registrados etc.
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Lei dos Sexagenários
O crescimento do movimento abolicionista na década de 1880 foi notável, e a causa foi abraçada por diferentes classes sociais do Brasil. O fortalecimento do abolicionismo fez crescer as ações de resistência contra a escravidão, fossem essas legais ou ilegais (à luz da legislação da época). O fortalecimento do movimento de libertação gerou uma reação conservadora, e a Lei dos Sexagenários foi um reflexo disso.
Depois que foi decretada a emancipação de escravos no Ceará e Amazonas, em 1884, foram criados 49 Clubes da Lavoura que defendiam os interesses dos escravocratas.|1| O objetivo era barrar o avanço do abolicionismo, e isso resultou na aprovação da Lei dos Sexagenários, em 28 de setembro de 1885.
Essa lei concedia a alforria para os escravos que tivessem mais de 60 anos, mas possuía condições rígidas. Os escravos beneficiados com a libertação deveriam trabalhar por três anos para seus senhores como forma de indenização. Além disso, tal lei proibia-os de mudarem-se da cidade na qual haviam sido alforriados, durante um período de cinco anos. Essa lei também estipulava o preço desses escravos como máximo no registro nacional.
Essa lei foi considerada um retrocesso pelos abolicionistas porque retardava o avanço da causa. Não obstante, os esforços dos escravocratas não deram certo, pois a resistência à escravidão continuou crescendo e resultou na Lei Áurea.
Lei Áurea
A Lei Áurea foi decretada em 13 de maio de 1888, depois ter sido aprovada no Senado e assinada pela princesa Isabel. Essa lei decretou a abolição definitiva e imediata da escravatura no Brasil e foi resultado da forte pressão popular sobre o Império. Por meio dela, cerca de 700 mil escravos conquistaram sua liberdade.
Guerra dos Mascates
Guerra dos Emboabas
Conflito armado ocorrido na região das Minas Gerais entre os anos de 1707 e 1709, envolvendo os bandeirantes paulistas e os emboabas (portugueses e imigrantes de outras regiões do Brasil). O confronto tinha como causa principal a disputa pela exploração das minas de ouro recém-descobertas na região das Minas Gerais. Os paulistas queriam exclusividade na exploração da região, pois afirmavam que tinham descoberto as minas.
O conflito mais importante e sangrento ocorreu em novembro de 1708 no distrito de Ouro Preto. Os embobas dominaram a região das minas e os paulistas se refugiaram na área do Rio das Mortes.
Revolta dos Malês
A Revolta dos Malês foi uma revolta de escravos que aconteceu na cidade de Salvador, na Bahia, em 1835. Essa foi a maior revolta de escravos da história do Brasil e mobilizou cerca de 600 escravos que marcharam nas ruas de Salvador convocando outros escravos a se rebelarem contra a escravidão. A Revolta dos Malês, que ficou marcada pela grande adesão de africanos muçulmanos, acabou fracassando e os envolvidos foram duramente punidos.
Inconfidência ou Conjuração?
O movimento que estudamos neste texto é conhecido como Inconfidência Mineira ou Conjuração Mineira. As duas formas podem ser utilizadas para se referir a esse acontecimento histórico, apesar de existir um debate entre os historiadores a respeito de qual termo é mais apropriado para ser utilizado.
Muitos historiadores não utilizam “inconfidência” sob a alegação de que foi um termo cunhado pela Coroa portuguesa e sua utilização alinha-se a uma perspectiva colonizadora. A palavra “inconfidente” é utilizada para se referir a um traidor, a uma pessoa desleal, infiel. Na perspectiva portuguesa, todos os que se voltaram contra Portugal eram traidores, logo, inconfidentes.
Assim, existem historiadores que consideram “conjuração” uma forma mais apropriada de se referir a esse acontecimento.
A Inconfidência Mineira, ou Conjuração Mineira, é como ficou conhecida a revolta de caráter separatista que estava sendo organizada na capitania das Minas Gerais no final do século XVIII. Essa revolta foi organizada pela elite socioeconômica de Minas Gerais e acabou sendo descoberta pela Coroa portuguesa antes de ser iniciada. Tiradentes foi um dos envolvidos nessa revolta.
Antecedentes
A capitania de Minas Gerais era a mais rica do Brasil, em razão da extração de ouro e diamantes na região. A exploração trouxe uma enorme riqueza e fez Minas Gerais prosperar e crescer. A atenção da Coroa portuguesa sobre sua capitania mais importante era redobrada e, no século XVIII, a relação entre os habitantes da capitania e a Coroa começou a demonstrar sinais de desgaste.
O imposto cobrado pela Coroa Portuguesa sobre todo o ouro encontrado em suas colônias correspondia a 20%, ou seja, 1/5 (um quinto) do metal extraído que era registrado em "certificados de recolhimento" pelas casas de fundição. Este absurdo e altíssimo imposto, foi intitulado "O Quinto".
Em 1720, por exemplo, aconteceu a Revolta de Vila Rica, motivada pela insatisfação da população local com os altos impostos cobrados pela Coroa. Outras revoltas aconteceram, mas não tinham o objetivo de separar a capitania da Coroa portuguesa.
A partir da segunda metade do século XVIII, a política fiscal de Portugal em relação à colônia tornou-se mais rígida. Portugal, governado pelo Marquês de Pombal, ordenou o aumento da cobrança de impostos no Brasil como forma de financiar a reconstrução de Lisboa, destruída por um terremoto em 1755. Isso contribuiu para corroer a relação entre colonos e Coroa até o ponto de, na década de 1780, começar a ser organizada uma conspiração.
Acesse também: Conheça as reformas realizadas em Portugal durante a administração pombalina
Participantes
A Conjuração Mineira foi uma conspiração organizada pela elite socioeconômica da capitania das Minas Gerais. Nas palavras das historiadoras Lília Schwarcz e Heloísa Starling, o grupo que formava os conspiradores da conjuração eram pessoas que “tinham laços familiares, de amizade ou econômicos” que os vinculavam com a “cúpula da sociedade das Minas”|1|.
Elas também destacam que, apesar de ser formado majoritariamente por membros da elite socioeconômica, o grupo era composto por pessoas dos mais diversos ofícios, tais como poetas, cônegos, engenheiros, médicos, militares, comerciantes etc.|2| O membro da conspiração de situação econômica mais humilde era Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, comandante da tropa que monitorava a estrada (Caminho Novo) que ligava o Rio de Janeiro a Minas Gerais. Ele, por sua vez, foi um dos membros mais participativos da conjuração.
Causas
Como abordado brevemente, a Inconfidência Mineira foi resultado da insatisfação da elite econômica da capitania das Minas Gerais com a política fiscal imposta pela Coroa portuguesa.
Como abordado, Essa revolta foi organizada pela elite socioeconômica de Minas Gerais e acabou sendo descoberta pela Coroa portuguesa antes de ser iniciada. A Inconfidência Mineira foi resultado da insatisfação da elite econômica da capitania das Minas Gerais com a política fiscal imposta pela Coroa portuguesa. Essa insatisfação existiu ao longo de todo o século XVIII, mas a partir da década de 1780 ganhou força e ares de separatismo, dando uma nova dimensão a esse movimento político.
Não se sabe o momento preciso em que a elite das Minas Gerais começou a conspirar contra a Coroa, mas se sabe que foi em algum ponto da década de 1780. Os envolvidos com essa revolta tinham em mente que os impostos cobrados por Portugal eram excessivos, mas também estavam imbuídos de outros ideais – como a separação de Minas Gerais e sua transformação em uma república.
Lília Schwarcz e Heloísa Starling chamam atenção para um fato: a conjuração foi resultado do ressentimento, mas também da percepção de que as Minas Gerais tinham condições de existir sem a presença de uma Coroa controladora. Eles tinham noção de que a capitania tinha condições econômicas de se autossustentar.
O estopim para a deflagração do movimento contra a Coroa aconteceu durante as administrações de Luís da Cunha Meneses e do Visconde de Barbacena, ambos governadores da capitania. O primeiro teve uma administração corrupta que prejudicou interesses da elite local para favorecimento de seus amigos pessoais.
Já na administração do Visconde de Barbacena, foi enviada uma ordem para realizar o cumprimento da cota de ouro anual, que era estipulada pela Coroa. Para cumprir essa cota, foi autorizada a realização da “derrama”, a cobrança obrigatória com o objetivo de alcançar as cem arrobas de ouro, havia a cobrança de um imposto chamado de Quinto. A Derrama correspondia à cobrança forçada dos quintos atrasados. Isso causou indignação porque a economia local estava em crise, em virtude da queda na quantidade de ouro extraído.
A lei da derrama decretava que cada região de extração de ouro deveria pagar 100 arrobas de ouro (cerca de 1500 quilos) por ano para Portugal. Quando esta meta não era atingida, soldados da coroa invadiam as casas das famílias para confiscarem seus pertences até que valor devido fosse completado.
A possibilidade de uma derrama alarmou a elite local e antecipou os preparativos para uma revolta contra a Coroa. Os conspiradores planejaram iniciar a revolta para o dia em que a derrama fosse realizada. Um dos grandes propagandistas dessa conspiração foi Tiradentes.
O que defendiam os inconfidentes?
As reivindicações feitas pelos inconfidentes eram variadas, mas, em geral, podem ser resumidas nos seguintes pontos:
· Obter a independência do Brasil em relação a Portugal
· Proclamação de uma república aos moldes dos Estados Unidos;
· Incentivo a instalação de manufaturas como forma de diversificar a produção econômica das Minas Gerais;
Na questão do trabalho escravo, não existia um consenso entre os inconfidentes. Assim, alguns defendiam a libertação dos escravos, mas outros defendiam a permanência da escravidão caso a capitania alcançasse sua independência.
Os colonos pensavam em realizar uma revolta em Vila Rica que depois se espalharia por toda a capitania. Para ter sucesso nessa empreitada, os inconfidentes planejavam uma guerra de desgaste que forçaria a Coroa portuguesa a negociar o fim das hostilidades. Eles buscaram ajuda internacional de americanos e franceses e até tiveram alguns acenos de apoio, mas que não se concretizaram em ações efetivas.
Como terminou a Inconfidência Mineira?
As reuniões secretas que organizavam e divulgavam os princípios dessa revolta contra Portugal estenderam-se durante anos, mas o movimento não chegou nem ao ponto de ser deflagrado. Isso porque, antes mesmo de sua deflagração, denúncias levaram ao conhecimento da Coroa de que uma conspiração acontecia.
Em 18 de maio de 1789, alguns dos inconfidentes foram informados de que a conspiração contra Portugal tinha sido descoberta. O Visconde de Barbacena recebeu seis denúncias a respeito de uma conspiração em curso nas Minas Gerais. A denúncia mais importante foi realizada por Joaquim Silvério dos Reis.
Silvério dos Reis estava envolvido com a conspiração e devia grandes somas de dinheiro à Coroa portuguesa. Acabou denunciando o movimento organizado pelos inconfidentes como uma forma de ter as suas dívidas perdoadas. O relato de Silvério dos Reis deu todos os detalhes da estratégia da inconfidência e permitiu que autoridades coloniais planejassem a repressão contra os envolvidos.
O Visconde de Barbacena ordenou a suspensão da derrama e deu início às prisões e interrogatórios. Todo o processo de julgamento dos presos por envolvimento na conspiração estendeu-se durante três anos e foi uma demonstração de poder da Coroa como forma de desencorajar outras conspirações do tipo.
A leitura da sentença, conforme afirmação do historiador Boris Fausto, estendeu-se por dezoito horas|4|. As condenações foram as mais diversas e incluíram penas como degredo (expulsão para a África), prisão perpétua, condenação à forca etc. Vários dos envolvidos foram condenados por morte na forca, mas d. Maria, rainha de Portugal, perdoou todos os condenados, menos um: Tiradentes.
Tiradentes foi preso no Rio de Janeiro, em maio de 1789. Sua morte foi utilizada como exemplo de intimidação e ocorreu porque Tiradentes era o grande propagandista do movimento. Quando preso, estava em viagem para divulgar a conspiração que estava sendo organizada.
Tiradentes acabou sendo enforcado no dia 21 de abril de 1792, no Rio de Janeiro. Foi esquartejado e partes do seu corpo foram espalhadas pela estrada que ligava o Rio de Janeiro a Minas Gerais. Sua cabeça foi colocada em exposição na praça central de Vila Rica e lá permaneceria até apodrecer, mas acabou desaparecendo e não se sabe o seu paradeiro até hoje.
A Conjuração Mineira foi uma das mais importantes revoltas organizadas contra a Coroa portuguesa e mostrou a disposição dos colonos a romper o laço colonial e a existência de ideais republicanos no seio da principal capitania brasileira. Poucos anos depois, foi a vez da Bahia rebelar-se contra o domínio português na Conjuração Baiana.
Podemos
considerar a Inconfidência Mineira como um exemplo valoroso da luta dos
brasileiros pela independência, pela liberdade e contra um governo que
tratava sua colônia com violência, autoritarismo, ganância e falta de
respeito.
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Conjuração Baiana
A Conjuração Baiana ou Revolta dos Alfaiates foi um importante movimento emancipacionista ocorrido no Brasil-colônia em 1798. Os ideais liberais e revolucionários começaram a ser difundidos entre os baianos ilustres da época, que eram adeptos das ideias iluministas francesas.
Causas da Conjuração Baiana
Para compreender a deflagração do movimento, devemos nos reportar à
transferência da capital para o Rio de Janeiro, em 1763. Com tal
mudança, Salvador (antiga capital) sofreu com a perda dos privilégios e a
redução dos recursos destinados à cidade. Somado a tal fator, o
aumento dos impostos e exigências colônias vieram a piorar
sensivelmente as condições de vida da população local.
No final do século XVIII, a população de Salvador encontrava-se em uma situação que beirava a miséria. Era composta de cerca de vinte mil brancos e índios e quarenta mil negros e mulatos e havia poucas atividades lucrativas, entre elas a exportação, para a África, de açúcar, cachaça, fumo em rolo, trocados por escravos em Angola.
Também contribuía para o empobrecimento da cidade o excessivo número de impostos cobrados por Lisboa, assim como a transferência da capital colonial de Salvador para o Rio de Janeiro, em 1763.
Outro fator de revolta da população de Salvador eram os abusos cometidos pelos contratadores de gêneros de primeira necessidade. Como eram os únicos autorizados a comercializar produtos vindos da Europa, abusavam nos preços e recusavam-se a aceitar as moedas de cobre, as únicas que a população mais pobre possuía.
A população pobre sofria com o aumento do custo de vida, com a escassez de alimentos e com o preconceito racial. As agitações eram constantes. Entre 1797 e 1798 ocorreram vários saques em açougues, aos armazéns do comércio de Salvador, também em carregamentos que chegavam para as famílias mais ricas e até os escravos que levavam a carne para o general-comandante foram assaltados. A população faminta roubava carne e farinha. Em inícios de 1798, a forca, símbolo do poder colonial, foi incendiada. O descontentamento crescia também nos quartéis, onde incidentes envolvendo soldados e oficiais tornavam-se frequentes, e reclamavam dos baixos salários. Havia, portanto, nesse clima tenso, condições favoráveis para a circulação das ideias de Igualdade, Liberdade e Fraternidade.
Enquanto a população pobre vivia esse clima de pré-revolução, a elite letrada tomava contato com as ideias mais revolucionárias da Revolução Francesa por meio do comandante francês Antoine René Larcher, que chegou a Salvador em 1796.
A fase mais radical da Revolução Francesa foi aquela na qual os jacobinos (membros da pequena e média burguesia, além dos operários da cidade de Paris, conhecidos como sans-culottes) governaram a França, constituindo um governo mais popular do que elitizado. Das reuniões para discutir o ideário dos jacobinos em Salvador, nasceu uma sociedade chamada “Os Cavaleiros da Luz”, formada por padres, comerciantes, senhores de engenho e profissionais liberais.
Reunião dos Cavaleiros da Luz discutindo o fim da opressão colonial.
A fim de divulgar suas ideias de liberdade política e social, o grupo elaborou panfletos que passaram a circular livremente por Salvador e acabaram chegando às mãos daqueles que não participavam da sociedade ilustrada, mas que, por motivos concretos, também pensavam em fazer uma revolução para acabar com o domínio português. Foi dessa forma que a elite intelectual e econômica se uniu às camadas mais pobres de Salvador no movimento chamado Conjuração Baiana ou Revolta dos Alfaiates.
Ideias e os Objetivos da Conjuração Baiana
Quando amanheceu o dia 12 de agosto de 1798, as paredes de Salvador estavam cobertas por manuscritos que apresentavam os principais pontos do programa do governo que a revolução iria instituir.
O movimento precipitou-se quando alguns de seus membros, distribuindo os panfletos na porta das igrejas e colando-os nas esquinas da cidade. Esses panfletos foram fixados na esquina da Praça do Palácio, nas paredes da cabana da preta Benedita, na Igreja de São Bento, entre outros locais de grande circulação, pontos centrais da cidade e convocavam a população para revolução que atenderia às demandas do povo, separando a Bahia do domínio de Portugal.
Nesse manifesto, dirigido ao Poderoso e Magnífico Povo Baiense Republicano, os revoltosos propunham a proclamação de uma república, a abertura dos portos a todas as nações, principalmente à França, liberdade de comércio, a abolição da escravidão, a instauração de um governo igualitário onde as pessoas fossem vistas de acordo com a capacidade e merecimento individuais, fim das discriminações entre brancos e negros, o fim de todos os privilégios e da tributação excessiva, o aumento dos salários dos saldados e promoções para os oficiais e vigilância sobre as “atividades contrarrevolucionárias dos padres”.
O documento mostra a influência jacobina, que se manifesta na igualdade absoluta e no anticlericalismo. Tais ideias eram divulgadas, sobretudo pelos escritos do soldado Luiz Gonzaga das Virgens e panfletos de Cipriano Barata, médico e filósofo.
Mas o panfleto não dizia como deveria ser a ação revolucionária. A fim de discutir esse assunto, foi convocada uma reunião para o dia 20 de agosto de 1798, para a qual foram convidadas várias pessoas, inclusive o governador da Bahia, que, dessa forma, ficou sabendo da rebelião.
Um desses panfletos declarava:
Líderes da Conjuração Baiana
Entre os participantes do movimento estavam o padre Francisco Agostinho Gomes, José da Silva Lisboa (que mais tarde tornou-se visconde de Cairu), o senhor de engenho Inácio Siqueira Bulcão, o cirurgião Cipriano José Barata de Almeida, o professor Francisco Moniz Barreto, homens das camadas médias da população, como o tenente José Gomes de Oliveira Borges, os funcionários Carlos Baltasar da Silva e Francisco Gomes dos Santos e os comerciantes José Vilela de Carvalho e Manuel José da Mata.
Das camadas mais humildes, participaram os alfaiates João de Deus Nascimento e Manuel Faustino Santos Lira (que era um escravo liberto), o escravo e alfaiate Luís de França Pires e os soldados Lucas Dantas e Luís Gonzaga das Virgens. Além dos citados, muitos outros elementos da população pobre – escravos, ex-escravos e artesãos – participaram da conjura.
O fim da conjura e suas consequências
O governador iniciou a repressão prendendo Domingos da Silva Lisboa, suspeito de haver escrito os panfletos, e Luís Gonzaga das Virgens. Essas prisões levaram o alfaiate João de Deus a convocar uma reunião de todos os líderes para o dia 25 de agosto, quando discutiriam uma forma de libertar os companheiros presos.
Informantes do governador infiltrados no grupo avisaram-no sobre a reunião e sobre os seus participantes. A partir daí vêm as prisões de João de Deus, Lucas Dantas, Manuel Faustino e dos irmãos José Raimundo e Cipriano José Barata de Almeida.
No total, foram presos e processados 33 conjurados, dos quais onze eram escravos, cinco alfaiates, nove militares, um carpinteiro, dois ourives, um bordador, um pedreiro, um cirurgião, um comerciante e um professor.
O processo durou um ano e condenou seis rebeldes à morte, todos eles pertencentes ao grupo popular. Os homens de posse envolvidos no processo fizeram muita pressão a fim de amenizar seu envolvimento na conspiração. O senhor de engenho Inácio Bulcão, por exemplo, escapou da prisão porque era genro do secretário do governo. Dos condenados, um teve a pena trocada por degredo e outro não foi capturado.
No dia 8 de novembro de 1799, Lucas Dantas, Luís Gonzaga, João de Deus e Manuel Faustino foram executados e seus corpos, esquartejados, ficaram expostos nas ruas de Salvador durante cinco dias. As autoridades luso-brasileiras reafirmavam que a justiça usava dois pesos e duas medidas para julgar ricos e pobres pelo mesmo crime.
Foi nesse contexto que o governo de Napoleão voltou seus
olhos para o pequeno reino de Portugal.
No início do século XIX, os planos de expansão do imperador francês Napoleão Bonaparte estavam em franco desenvolvimento. Em sua pretensão de conquistar a Europa, acabou desafiando a Grã-Bretanha. O exército napoleônico era imbatível, mas a supremacia da marinha britânica era incontestável. A França napoleônica decretou, então, o Bloqueio Continental, que consistia em impedir os navios ingleses de ancorar nas cidades portuárias europeias. A expressão "bloqueio continental" remete ao decreto de Napoleão Bonaparte, de 1806, que declarava estar a Inglaterra em "estado de bloqueio", ou seja, que estava proibido o comércio com os ingleses. Napoleão, então, passou a forçar os outros reinos europeus a aderirem ao bloqueio.
Foi nesse contexto que o governo de Napoleão voltou seus olhos para o pequeno reino de Portugal, Napoleão pressionou Portugal a aderir ao Bloqueio Continental. Portugal aliado à Grã-Bretanha a mais de um século, preocupava-se que a Inglaterra poderia abrir o caminho da França para a Ásia, a África e, principalmente, o Brasil, fonte principal das rendas portuguesas.
D. João exercia a regência de Portugal desde 1792, pois sua mãe, d. Maria I, abalada pela perda de um filho e do marido em um curto período de tempo, estava impossibilitada de reinar.
Apesar de pressionado pelos franceses, o príncipe regente d. João e seus conselheiros evitavam aderir ao Bloqueio Continental e se indispor com os ingleses. Portugal tinha a Inglaterra como principal parceira para seus negócios. Pressionados por Napoleão, os portugueses não tiveram escolha: como não podiam abdicar dos negócios com a Inglaterra, não participaram do Bloqueio Continental.
Chegaram a esboçar o fechamento dos portos lusitanos aos ingleses, no entanto voltaram atrás. D. João parecia vacilar, mas procurava ganhar tempo. Com isso, conseguia contornar as pressões da França, sem ferir diretamente a Inglaterra. Entretanto, essa era uma estratégia com dias contados.
Invasão da tropas Napoleônicas em Portugal
A partir de julho de 1807, Napoleão ameaçou invadir o território português caso d. João não rompesse com a Inglaterra. Todos os meios diplomáticos de Portugal foram acionados para tentar demover os franceses dessa decisão, sem resultado.
Militarmente, os portugueses não teriam como resistir a um ataque das tropas de Napoleão Bonaparte ao seu território. Economicamente, era impossível que os portugueses abrissem mão do consumo das mercadorias britânicas. Mediante esse impasse, Dom João VI, passou a adotar uma postura indefinida junto às duas potências que o pressionavam.
Preferindo aliar-se aos ingleses, o reino de Portugal assinou uma convenção secreta, na qual ficava decidida a transferência do governo português para o Brasil. Enquanto os ingleses se comprometiam a defender o território lusitano contra a França, a Coroa Portuguesa entregava sua esquadra e garantia a abertura dos portos brasileiros para os ingleses.
Nesse meio-tempo, o ministro inglês, lorde Strangford, auxiliado pelo português d. Rodrigo de Souza Coutinho, conde de Linhares, tentava convencer d. João a mudar a sede do reino para o Brasil.
No dia 29 de novembro de 1807, diversas embarcações saíram de Portugal levando a nobreza e a Família Real daquele país ao Brasil.
Embarque da Família Real no cais de Belém, em novembro de 1807. Essa imagem retrata figurativamente o embarque da Corte portuguesa para o Brasil, no porto de Belém, em Lisboa. Observe a quantidade de pessoas amontoadas nos coches e os navios ao longe, à espera da partida. O embarque da família real se deu dois dias antes, mas uma tempestade reteve a frota até o dia 29. Pintura de Nicolas Louis Albert Delerive, de 1807- -1818. Museu Nacional dos Coches, Lisboa, Portugal.
O objetivo imediato da mudança para o Brasil era fugir de Portugal para manter intacta a Coroa portuguesa. Mas o plano de alguns conselheiros era mais ambicioso: formar um imenso império luso-brasileiro no Atlântico, transferindo a sede do governo português para o Rio de Janeiro, capital do Vice-Reinado do Brasil.
Os preparativos para a viagem foram acelerados com a notícia de que o general francês Jean-Andoche Junot, à frente de um exército de 23 mil homens, estava prestes a invadir Lisboa, vindo da Espanha. A esquadra, levando boa parte da Corte portuguesa, partiu na manhã de 29 de novembro de 1807, escoltada por navios britânicos. Logo em seguida, as tropas francesas chegaram à cidade. Segundo relatos, o tão temido exército era bem menos numeroso e estava bastante enfraquecido, com soldados maltrapilhos, esfomeados e sem munição suficiente para conquistar o que quer que fosse.
Para escoltar sua Corte até o Continente Americano, os portugueses acionaram a frota inglesa que, ao chegar a este lado do Império, assinou o Tratado Econômico de Abertura dos Portos “às nações amigas”.
O decreto de Abertura dos Portos às Nações Amigas foi a primeira Carta Régia promulgada pelo Príncipe Regente no Brasil, que se deu apenas seis dias após sua chegada, com a Família Real.
D. João chegou a Salvador, na Bahia, em 22 de janeiro de 1808, onde permaneceu por um mês. Na antiga capital da colônia, o príncipe assinou a Carta Régia que liberou os portos brasileiros às nações amigas. Com a ocupação francesa em Portugal, o governo tinha de providenciar com rapidez o acesso a sua principal fonte de receitas: os impostos alfandegários.
A Carta ordenava Liberar os portos ás nações amigas, que todas as mercadorias fossem admitidas nas alfândegas do Brasil, transportadas ou não por navios portugueses, pagando o imposto de 24% sobre seu valor. Determinava, também, que tanto os súditos de Portugal como os estrangeiros poderiam exportar para qualquer porto os produtos do Brasil — com exceção do pau-brasil e do diamante-, pagando os impostos usuais.
Os
comerciantes locais ficaram muito satisfeitos, pois se abriu a
possibilidade de negociarem
diretamente com outros mercados. Estavam preparados para o novo papel,
pois praticavam
rotineiramente, desde o século XVIII, o tráfico de escravos, em um
comércio que envolvia várias
praças mercantis do Brasil, da Ásia e da África.
Os grandes prejudicados foram os comerciantes de Portugal, que perderam a
exclusividade na intermediação entre os mercados colonial e europeu.
A chegada da Família Real ao Brasil provocou mudanças significativas. Depois de uma breve passagem por Salvador, capital do Estado do Brasil até 1763, Dom João chegou ao Rio de Janeiro (capital do Brasil na época) e lá estabeleceu a nova sede do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves. Isto concorreu para a transformação daquela cidade e da própria colônia.
RESIDÊNCIAS NOBRES
Quando da chegada da Corte portuguesa ao Rio de Janeiro, o vice-rei do Brasil, o conde dos Arcos, reservou seu palácio para moradia da Família Real e sede do governo,A primeira residência de D. João foi a Edificação do Paço, antiga moradia dos vice-reis. Em seguida, foi doado por um rico comerciante português, Elias Antônio Lopes, o Palácio da Quinta da Boa Vista, em São Cristovão, onde hoje funciona o Museu Nacional de História Natural, em troca de inúmeros benefícios.
Muitos dos demais nobres requisitaram outras residências para o príncipe regente e foram atendidos. Era um privilégio da nobreza de Portugal tomar posse de moradias, mesmo que os proprietários as habitassem.
Para acomodar os acompanhantes da corte, o conde dos Arcos instituiu o sistema de aposentadorias que, na prática, que consistia em dar alojamento (aposento) a quem estivesse a serviço do rei ou o acompanhasse em alguma viagem, desta forma, requisitava as casas dos moradores locais para aconchego da nobreza. Era o caso dos funcionários reais e dos nobres que chegaram ao Rio e que solicitavam uma moradia ao príncipe regente.
Na porta de muitas casas foram pregadas as letras PR– Príncipe Regente –, e os ocupantes eram obrigados a sair, mesmo sendo os proprietários da moradia. O proprietário não perdia o imóvel, que passava a ser alugado pelos novos moradores. Quando uma residência era requisitada, a população ironizava, o que se tornou odiosa para a população do Rio de Janeiro, interpretadas pela população como "Ponha-se na Rua" ou Prédio Roubado."
“O afluxo de uma grande quantidade de pessoas agravou os problemas urbanos. Além da falta de moradia, havia carência no abastecimento de água, saneamento, segurança pública”, descreve o historiador Paulo de Assunção (2008: 88). Essa situação causou um enorme rebuliço tanto para a população que ficava desabrigada, quanto para a nobreza portuguesa que considerava as moradias desconfortáveis, mal construídas e sem o luxo das suas residências em Lisboa.
Características principais do Primeiro Reinado do Brasil
O Primeiro Reinado brasileiro tomou forma e primórdios a partir do ano de 1822, data na qual a coroa portuguesa desembarcou com a intenção de ficar no país.
O período monárquico é caracterizado por rupturas lentas e graduais, buscando a conciliação sem radicalização. Nas políticas sociais e culturais observamos vários elementos de continuidade.
A primeira fase não durou muito (1822 a 1831), sob a regência de D. Pedro I. Nesse período, aconteceram fatos importantes, como o surgimento da Assembleia Constituinte, em 1823, Constituição da Mandioca e o advento da Constituição, no ano seguinte. Além disso, revoltas e envolvimento em guerras levaram a uma insatisfação coletiva com a forma na qual D. Pedro I conduzia o seu império.
Embora a Constituição tenha sido elaborada em 1824, D. Pedro I já convocava uma Assembleia Constituinte dois anos antes, tendo a primeira reunião ocorrida em 1823.
Nesse período, dois grupos disputavam o poder: o partido português e o partido brasileiro. O partido português reivindicava poderes absolutos para D. Pedro I; e o partido brasileiro queria a submissão do monarca ao parlamento. José Bonifácio, ministro do Império, tentou conciliar o interesse dos dois partidos.
As elites portuguesas buscavam a centralização política. Fato que levou o fechamento da assembleia constituinte em 1823 e outorgada a Constituição em 1824.
Com a Constituição, ele acreditava que os interesses do seu governo e da população, estariam assegurados. Em 1824, ela foi assinada, contando somente com a participação dos homens de elite que viviam no país.
Como a Constituição era inteiramente focada nos interesses da elite, as camadas mais baixas da população se revoltaram e, com isso, a Confederação do Equador acabou acontecendo pouco tempo depois (1824).
A Confederação do Equador foi um grande movimento revolucionário de caráter separatista e republicano que se organizou contra o imperador. A revolta, no entanto, acabou silenciada pela violência das tropas imperiais.
A Guerra da Cisplatina, que ocorreu no ano de 1825, também teve papel fundamental na abdicação ao trono – que aconteceria apenas seis anos depois. Nela, a província Cisplatina decidiu se separar do Brasil e incorporar-se à República Argentina.
D. Pedro I, revoltado, declarou guerra à Argentina, cujas tropas regressaram derrotadas para casa. Com a intervenção da Inglaterra, um acordo entre os países foi assinado e, assim, a Cisplatina se tornou independente, mudando seu nome para a República do Uruguai.
As pressões políticas, as derrotas degradantes e a tirania de D. Pedro I, que não agradavam nem um pouco a população, fizeram com que o imperador abrisse mão do trono, deixando o caminho livre para o seu filho, D. Pedro II, com apenas cinco anos, assumir quando tivesse idade para tal responsabilidade.
O PRIMEIRO REINADO
O Primeiro Reinado teve início com a independência brasileira declarada em 07 de setembro de 1822, mas ainda era necessário consolidar a mesma no país. Dom Pedro I garantiu o fim das lutas provinciais rebeldes que eram contrárias à autonomia política do Brasil em relação a Portugal. O Brasil obteve o reconhecimento internacional, por parte da Inglaterra, Estados Unidos, México e Portugal com mediação da Inglaterra. Nesse acordo o Brasil pagaria uma indenização a Portugal, além de ceder o título de imperador honorário do país a dom João VI e não incentivaria as colônias portuguesas na África a lutar pela independência.
O período monárquico é caracterizado por rupturas lentas e graduais, buscando a conciliação sem radicalizações. Nas políticas sociais e culturais observamos vários elementos de continuidade.
As instituições brasileiras sólidas e moralmente contra a radicalização e a fragmentação, de certa forma, impediram o avanço de mudanças desejadas pela sociedade em romper com o equilíbrio da ordem.D.
Pedro I elabora a primeira constituição brasileira nesse ponto de tensão social, onde o objetivo era manter a ordem, a hierarquia social e política sem liberdades, além de conservar a propriedade, a unidade territorial, o tráfico de escravos, a escravidão, o distanciamento da participação política dos excluídos da sociedade da constituição de 1824, que eram esses: mulheres, escravos, indígenas e homens pobres, estabelecido pelo voto censitário, e a visão da agricultura para o progresso no sistema de plantation.
O sentido de nação e liberdade está relacionado no ideal de unidade dos interesses das elites, na garantia de uma continuidade cultural, política e econômica hegemônicas na sociedade.
As elites brasileiras disputavam a descentralização do poder político no país, enquanto D. Pedro I e as elites portuguesas buscavam a centralização política. Fato que levou ao fechamento da assembleia constituinte e a outorga da primeira constituição do país em 1824.
As classes dominantes temiam o poder central, mas tinham pavor da desordem. Por esse motivo conservadores e liberais desejavam a ordem e a escravidão, e traziam a ideia do branco civilizado que era livre e proprietário de escravos.
Assim aceitaram a outorga da Constituição e a monarquia como forma de governo, pois temiam a fragmentação do império para garantir a unidade territorial, a manutenção das tradições dominantes sem transformações sociais.
O aumento das tensões políticas, o agravamento da crise financeira do Brasil, a derrota na Guerra da Cisplatina, a criação da República Oriental do Uruguai e a questão sucessória com a morte de dom João VI.
Em
meio a estas tensões, D. Pedro I resolve fazer uma visita aos liberais de Minas
Gerais, em 1831. Não é bem recebi nesta província, e então, quando regresso
para o Rio de Janeiro, os portugueses que residiam nesta cidade e eram seus
partidários, fizeram uma festa com luminárias para receber o imperador. Os
brasileiros, descontentes, começaram a quebrar as janelas dos portugueses.
Estes últimos revidaram atirando garrafas contra os primeiros, constituindo
assim o episódio conhecido como Noite
das Garrafadas.
Em meio a tudo isso, os desdobramentos do exercício do Poder Moderador por D. Pedro, a rixa entre políticos conservadores e liberais, bem como a rivalidade entre brasileiros e portugueses que estavam radicalizados no Brasil, e que foram os motivos que D. Pedro I decide abdicar do trono em 7 de abril de 1831, em favor de seu filho, D. Pedro de Alcântara. No bilhete de sua abdicação está escrito: “Usando do direito que a Constituição me concede, declaro que, hei mui voluntariamente, abdicado na pessoa do meu muito amado e prezado filho, o sr. D. Pedro de Alcantara. Boa Vista, sete de abril de mil oitocentos e trinta e um, décimo da Independência e do Império. Pedro.”
Assembleia Constituinte de 1823
A elaboração de uma Constituição passava pela formação de uma Assembleia Constituinte (instituição formada por parlamentares que trabalha na redação do documento). Aqui no Brasil, uma Assembleia Constituinte tinha sido formada antes mesmo de a independência ser declarada, pois aqueles que defendiam essa ideia já haviam percebido que o país não tinha uma instituição política para administrá-lo.
Assim, d. Pedro passou a ser pressionado para a convocação de uma Assembleia Constituinte, e, como resultado, ela foi ordenada em 3 de junho de 1822. Isso já demonstrava uma intenção expressa de independência, pois o documento de convocação falava em “independência moderada pela união nacional”.
A Assembleia Constituinte iniciou seus trabalhos somente em 3 de maio de 1823. Antes disso, os deputados haviam se reunido, em 17 de abril de 1823, como membros da Assembleia Legislativa, e, dos 90 deputados eleitos, somente 52 estiveram presentes. Eles formavam a elite do Brasil, e muitos eram bacharéis, militares, padres, grandes proprietários de terra etc.
Politicamente, os deputados que faziam parte da Assembleia Constituinte formaram dois grupos ideologicamente distintos e que foram definidos pelos historiadores como “conservadores” e “liberais”. Resumidamente podemos defini-los da seguinte maneira:
- Conservadores: formavam o “partido português”, que defendia a implantação de uma monarquia no Brasil aos moldes absolutistas. Havia neles um grande número de portugueses.
- Liberais: formavam o “partido brasileiro” e defendiam a implantação de algumas liberdades civis e políticas no Brasil. Defendiam uma monarquia constitucional, marcada pela limitação dos poderes do imperador, e uma divisão muito clara da jurisdição de cada um dos três poderes. Dentro dos liberais, havia uma ala conhecida como “exaltada”, que defendia mudanças mais profundas no país — o que incluía um sistema federalista, a abolição do trabalho escravo e a implantação de uma república.
O trabalho realizado pelos constituintes teve de dar conta da divisão ideológica que existia na Constituinte. No que se refere à relação com o imperador, inicialmente, o vínculo entre os parlamentares e ele foi bastante amistoso, e fala-se, ainda, em uma postura cordial do imperador.
Essa situação mudou radicalmente quando os constituintes finalizaram, em novembro de 1823, o texto da proposta de Constituição que recebeu o nome de Constituição da Mandioca. Esse modelo não agradou d. Pedro, que interveio na situação de maneira autoritária. A Constituinte foi fechada, alguns parlamentares foram presos, e a Constituição da Mandioca foi barrada.
O que desagradou a d. Pedro foi especificamente que esse documento propunha a divisão dos poderes, mas criava mecanismos que sujeitavam o Executivo ao Legislativo. Assim, os poderes do imperador ficariam limitados e os parlamentares teriam amplos poderes políticos. Além disso, um item proibia estrangeiros de ocuparem cargos políticos no Brasil.
As duas propostas não agradavam tanto ao imperador quanto aos membros do partido português, e ambos aproximaram-se no período de atuação da Constituinte. Pedro I, já que tinha ideais absolutistas e centralizadoras. Por conta deste fato, o imperador, usando forças militares, cercou e dissolveu a Assembleia Constituinte pois não aceitou ter seus poderes limitados.
O fechamento da Assembleia Constituinte aconteceu em 12 de novembro de 1823, e esse evento recebeu o nome de Noite da Agonia.
A Constituição de 1824
A primeira Carta Magna brasileira garantia a unidade territorial, instituía a divisão do governo em quatro poderes e estabelecia o voto censitário (voto ligado à renda do cidadão).
Foi elaborada por um grupo reduzido de pessoas devido às desavenças entre o Imperador e a Assembleia Nacional Constituinte.
Características da Constituição de 1824
- o regime de governo estabelecido foi a monarquia hereditária.
- Existência de Quatro poderes: Poder Executivo, Poder Legislativo, Poder Judiciário e o Poder Moderador.
- O Poder Moderador, exercido pelo imperador, lhe dava o direito de intervir nos demais poderes, dissolver a assembleia legislativa, nomear senadores, sancionava e vetava leis, nomeava ministros e magistrados, e os depunha.
- Poder Executivo: exercido pelo Imperador que, por sua vez, nomeava os presidentes de províncias.
- Poder Legislativo: era composta pela Câmera dos Deputados e pelo Senado. Os deputados eram eleitos por voto censitário e os senadores eram nomeados pelo Imperador.
- Poder Judiciário: os juízes eram nomeados pelo Imperador. O cargo era vitalício e só podiam ser suspensos por sentença ou pelo próprio Imperador.
- Direito ao voto: para homens livres, maiores de 25 anos, e renda anual de mais de 100 mil réis era permitido votar nas eleições primárias onde eram escolhidos aqueles que votariam nos deputados e senadores.
- Por sua parte, para ser candidato nas eleições primárias, a renda subia a 200 mil reis e excluía os libertos.Por fim, os candidatos a deputados e senadores deviam ter uma renda superior a 400 mil réis, serem brasileiros e católicos.
- Estabeleceu o catolicismo como religião oficial do Brasil. No entanto, a Igreja ficou subordinada ao Estado através do Padroado.
- Criação do Conselho de Estado, composto por conselheiros escolhidos pelo imperador.
- A capital do Brasil independente era o Rio de Janeiro que não estava submetida à Província do Rio de Janeiro. Esta tinha sua capital na cidade de Niterói.
Contexto histórico
Um produto da independência brasileira, a Constituição de 1824 surgiu da necessidade de legitimar o novo império e de formalizar um equilíbrio entre as várias classes sociais que disputavam o poder político após o fim do regime português, especialmente os escravocratas, que temiam revoltas da população majoritariamente escrava, e os imigrantes ainda leais a Portugal ("Partido Português").
As elites brasileiras disputavam a descentralização do poder político no país, enquanto D. Pedro I e as elites portuguesas buscavam a centralização política. Fato que levou ao fechamento da assembleia constituinte e a outorga da primeira constituição do país em 1824.
O imperador D. Pedro I também desejava criar uma constituição liberal, não despótica, aos moldes do que ocorria na Europa, portanto ele permitiu que o Conselho de Estado, composto por eminentes juristas, redigisse uma Carta de modo a controlar (ou tentar) os poderes do monarca. Em forma e conteúdo, o texto final tem clara inspiração na Constituição Francesa de 1814.
REVOLTAS DO PERÍODO REGENCIAL
A consequência dessa disputa de poder é a instabilidade política. Somada à essa questão, as condições precárias de grande parte da população dão origem a uma série conflitos:
- Cabanagem, na Província do Grão-Pará (1835 – 1840);
- Guerra dos
Farrapos (ou Revolução Farroupilha), na Província de São Pedro do Rio
Grande do Sul (1835 – 1845);
- Revolta dos Malês,
Província da Bahia (1835);
- Sabinada, na Província da Bahia (1837 – 1838);
- Balaiada, na Província do Maranhão (1838 – 1841).
Com o objetivo de acabar com toda esse descontentamento, desordem e agitação, o Partido Liberal propicia uma situação que sinaliza o fim do Período Regencial, o Golpe da Maioridade, declarando D. Pedro II maior de idade aos 14 anos. Um ano depois, D. Pedro começa a governar o Brasil e tem início o Segundo Reinado.
O ATO ADICIONAL DE 1834
No dia 12 de agosto de 1834, os membros da Câmara dos Deputados estabeleceram um conjunto de mudanças que afetaram diretamente as diretrizes da Constituição de 1824. Nesse dia, o chamado Ato Adicional aprovou uma série de mudanças que refletiam bem o novo cenário político experimentado. Agora, sem a intervenção do poder régio, as tendências políticas presentes, representadas pelas alas liberal e conservadora, tentavam se equilibrar no poder.
Nessa época, o papel político a ser desempenhado pelas províncias e pelo Poder Executivo era alvo de infindáveis discussões que colocavam esses dois grupos políticos em oposição. Por um lado, os conservadores defendiam os moldes da monarquia constitucional e as suas diretrizes políticas centralizadoras. Em contrapartida, os liberais acreditavam que os poderes régios deveriam sofrer limitações e que as províncias deveriam ter maior autonomia.
Na disputa entre essas facções políticas, o Ato Adicional seria uma maneira de se firmar um compromisso político que estivesse acima das rixas de cada grupo. Em primeiro aspecto, essa reforma da constituição autorizou cada uma das províncias a criar uma Assembleia Legislativa. Por meio dessa medida, os representantes políticos locais poderiam instituir a criação de impostos, controlarem as finanças e determinarem os membros do funcionalismo público.
Inicialmente, essa conquista parecia simbolizar uma expressa vitória política dos liberais, contudo, essas assembleias ainda se viam subordinadas aos mandos do presidente da província, que era escolhido pela indicação do governo central. Além disso, havia uma recomendação em que as províncias não deveriam se contrapor às deliberações provenientes da administração regencial. Dessa forma, observamos que a autonomia das províncias era cercada por uma infindável série de limites.
Essa mesma sensação contraditória se desenvolvia com a extinção do Conselho de Estado, mais uma das determinações criadas pelo Ato Adicional. Primordialmente, a extinção do Conselho de Estado dava fim àquele grupo de assessores políticos que auxiliavam o imperador no exercício do autoritário Poder Moderador. Porém, a preservação da duração vitalícia do cargo de Senador apontava a manutenção de um privilégio que agradava aos políticos conservadores.
Outra importante reforma que o Ato Adicional estipulou foi a extinção da Regência Trina e a escolha de apenas um representante para ocupar o cargo regencial. Com a formação da chamada Regência Una, vários candidatos se dispuseram a ocupar o novo cargo do poder executivo. Organizada por meio de eleições diretas e voto censitário, a escolha do regente, apesar de ser uma manifestação de tendência liberal, foi marcada por fraudes denunciadas em várias regiões do território nacional.
Alguns anos mais tarde, ainda se sentido prejudicados pelas liberdades oferecidas pelo Ato Adicional, os conservadores estipularam uma reação a essa primeira reforma da constituição. Pedro de Araújo Lima, o marquês de Olinda (1793-1870). A lei n. 105, promulgada em 12 de maio de 1840, teve por objetivo interpretar alguns dos artigos da revisão constitucional promovida pelo Ato Adicional em 1834. Em 1840, sob o domínio do regente conservador Araújo Lima, foi instituída a Lei de Interpretação do Ato Adicional. Segundo seus ditames, essa lei revogou o direito legislativo das províncias e estabeleceu que a Polícia Judiciária fosse controlada pelo Poder Executivo Central.
Esse ato também possibilitou a descentralização do poder, dando mais autonomia a algumas elites provinciais – fato que desagradava a oposição de tendência conservadora e centralizadora.
Com o Ato Adicional, as mudanças mais sensíveis foram:
· fim do poder moderador durante o Período Regencial;
· fim do Conselho de Estado;
· criação de Assembleias Legislativas provinciais;
· aumento dos poderes dos presidentes de província, mas a nomeação era função do imperador;
· substituição da regência trina por uma regência una.
FIM DO PERÍODO REGENCIAL COM O GOLPE DA MAIORIDADE
A Regência de Araújo Lima teve fim em 1840 com uma subversão parlamentar da Constituição de 1824, conhecida como o Golpe da maioridade, que possibilitou a D. Pedro II, então com 15 anos de idade, assumir o trono imperial.
O fim do Período Regencial foi resultado da disputa política entre liberais e conservadores. Os liberais insatisfeitos com a regência de Araújo Lima, um conservador, reagiram defendendo a antecipação da maioridade do príncipe do Brasil, Pedro de Alcântara. Os liberais conseguiram conquistar o apoio da maioria dos deputados e senadores e realizar o Golpe da Maioridade em 1840.
Com esse golpe, Pedro de Alcântara teve a sua maioridade antecipada e tornou-se imperador do Brasil com 14 anos de idade. Esse ato iniciou o Segundo Reinado e deixou os liberais satisfeitos porque foi retirado o poder das mãos dos conservadores. Os liberais também esperavam que a coroação do imperador colocasse fim à série de revoltas provinciais que aconteciam no país.
NEOLIBERALISMO
Neoliberalismo é uma doutrina econômica e política que surgiu no século XX com base em teorias formuladas por teóricos, como o economista ucraniano Ludwig von Mises e o economista austríaco Friedrich Hayek. A teoria neoliberal surge para opor-se à teoria keynesiana de bem-estar social e propõe uma nova leitura da parte econômica do liberalismo clássico, tendo como base uma visão econômica conservadora que pretende diminuir ao máximo a participação do Estado na economia.
CARACTERÍSTICAS DO NEOLIBERALISMO
Em geral, podemos dizer que as características do neoliberalismo, de acordo com as teorias dos estudiosos da Escola Austríaca, são o enfraquecimento do Estado e a diminuição drástica da participação estatal na economia. Os teóricos neoliberais defendem a mínima cobrança de impostos e a privatização dos serviços públicos.
A doutrina neoliberal prega a menor participação possível do Estado na economia, dando preferência aos setores privados.
Um esboço do plano neoliberal deu-se com as 10 regras do Consenso de Washington, que propôs uma cartilha básica que as economias neoliberais (em especial as economias em desenvolvimento que quisessem aderir à ajuda oferecida pelo FMI e pelo Banco Mundial) deveriam seguir. As 10 regras do Consenso de Washington que delineiam as características do neoliberalismo são:
· Disciplina fiscal: o estabelecimento de um teto de gastos públicos, o que, na prática, reduz ou limita os gastos com serviços básicos.
· Redução dos gastos públicos: deve contar com a disciplina fiscal e com outras medidas, como a privatização dos serviços públicos.
· Reforma tributária: reformular o modo de cobrar-se impostos. Em geral, o que o Consenso de Washington defende é a menor taxação de impostos possível.
· Juros de mercado: controlar os juros para que a inflação não cresça.
· Câmbio de mercado: operar trocas de mercado no mundo realizando importações e exportações de produto. Isso pode ser, em alguns casos, ruim para a economia local e para os pequenos e médios empresários.
· Abertura comercial: liberar o comércio com outros países não colocando entraves ideológicos ou políticos que dificultem as relações comerciais exteriores.
· Investimento estrangeiro direto: abrir filiais de empresas estrangeiras no país em desenvolvimento.
· Privatização de empresas estatais: privatizar todos os serviços que forem possíveis de privatização, ou seja, entregá-los à iniciativa privada. No Brasil, tivemos experiências de privatização escandalosas no governo de Fernando Henrique Cardoso, porque nele as nossas empresas estatais foram vendidas a preços muito baixos.
· Desregulamentação (flexibilização de leis econômicas e trabalhistas): flexibilização das leis que regulamentam a economia, o que significa diminuição da participação do Estado na economia, e das leis trabalhistas, o que significa menos direitos para os trabalhadores.
· Direito à propriedade intelectual: garantir aos autores de uma obra intelectual, científica, filosófica ou artística o direito de receber pela reprodução daquela obra.
Contexto histórico
O liberalismo econômico (também chamado de liberalismo clássico) foi uma doutrina econômica e política que surgiu no século XVIII e consolidou-se no século XIX como maneira de atender aos anseios da burguesia de expandir a industrialização. Nesse momento, houve uma defesa da não interferência do Estado na economia para que esta fosse regulada por si mesma e pudesse crescer.
Na teoria, os liberais defendiam que o liberalismo era a única saída viável para beneficiar a todos (mais ricos e mais pobres), pois essa doutrina permitiria o crescimento econômico e a expansão industrial, fazendo gerar mais emprego e renda. Na prática, o abismo social existente entre a burguesia e proletariado aumentou drasticamente e a qualidade de vida das camadas mais pobres da população piorou.
No fim do século XIX, a situação da classe trabalhadora era extremamente precária. Sem limites de jornadas de trabalho, sem previdência, sem férias remuneradas, sem descanso remunerado semanal e sem qualquer direito (inclusive a um salário mínimo), a burguesia era quem decidia as situações de contratação dos funcionários. No início do século XX, as organizações sindicais começaram a multiplicar-se e lutar cada vez mais pela conquista de direitos.
O economista inglês John Maynard Keynes percebeu que o sistema liberal não permitia a grande injeção de dinheiro na economia, pois a maioria da população não tinha dinheiro para consumir. Segundo Keynes, era papel do Estado garantir um padrão mínimo de qualidade de vida para a população mais pobre e criar leis que regulamentassem o trabalho, a fim de conceder direitos aos trabalhadores e melhorar as suas condições, criando um Estado de bem-estar social.
Concedendo direitos e garantindo um padrão mínimo de qualidade de vida para todos, o Estado estaria ajudando a economia, pois essa voltaria a girar com a injeção de dinheiro propiciada pela maioria da população, que teria acesso à saúde, à educação e a outros serviços básicos, além de mais dinheiro para consumir.
As medidas propostas por Keynes também garantiriam o pleno emprego, com o Estado atuando para evitar que o desemprego crescesse substancialmente, e controlaria a inflação — termo utilizado na economia para designar o aumento dos preços dos produtos, sendo que uma alta inflação não permite o consumo e faz a moeda perder seu valor. As consequências de uma inflação alta são o enfraquecimento do mercado com a diminuição das vendas e, consequentemente, da produção, afetando o comércio e as indústrias.
Em 1929, a Bolsa de Valores de Nova Iorque quebrou, gerando uma grave crise financeira que assolou o mundo todo. Foi um período de caos econômico e instabilidade, sobretudo nos Estados Unidos e na Europa. A partir desse momento, o presidente dos Estados Unidos Franklin Delano Roosevelt propôs o New Deal (novo acordo), que implantava medidas keynesianas para cessar a crise gerada pela crise de 1929.
Após a Segunda Guerra Mundial, algumas nações europeias também adotaram medidas sustentadas por Keynes, a fim de reconstruir o cenário de devastação deixado pela guerra, fazendo surgir a chamada social democracia (governo democrático capitalista, porém com políticas voltadas para o bem-estar social). Quem não ficou satisfeito com essa política foi o setor industrial, sobretudo as indústrias de grande porte.
O Estado de bem-estar social significava, para a classe empresarial, mais impostos a serem pagos e mais encargos trabalhistas (gastos com os direitos trabalhistas, como salário mínimo, jornada de trabalho fixa e regulada, previdência etc.). O Estado de bem-estar social requer uma máquina estatal forte e ampla, capaz de oferecer serviços básicos (saúde, alimentação, saneamento e educação) a toda a população. Para essa máquina funcionar, é preciso aumentar a arrecadação de impostos. O que os empresários não queriam fazer era pagar mais impostos.
Como proposta contrária ao modelo de Keynes, os teóricos da chamada Escola Austríaca de Economia, os economistas conservadores Ludwig von Mises e Friedrich Hayek, criaram uma nova teoria inspirada no liberalismo com propostas de redução do papel estatal, redução da máquina estatal e aumento da participação da iniciativa privada na economia.
Mais tarde, a Escola de Chicago, uma instituição liberal de economia estadunidense, também entrou na história do neoliberalismo com as teorias dos economistas Milton Friedman e George Stigler. Essa instituição foi responsável pela assessoria à primeira experiência prática do neoliberalismo que ocorreu no Chile, durante a ditadura militar comandada por Augusto Pinochet na década de 1970. A ex-primeira ministra britânica Margareth Thatcher também implantou medidas neoliberais na Inglaterra nas décadas de 1970 e 1980.
O economista austríaco Ludwig von Mises é um dos primeiros teóricos do neoliberalismo
A partir da primeira experiência, o neoliberalismo começa a crescer e a ganhar adeptos. Um desses é o Fundo Monetário Internacional (FMI) — uma agência da ONU criada em 1944 e que tem como objetivo observar, fiscalizar e atuar cooperativamente na economia global. O FMI visa, ao menos na teoria, criar um ambiente de cooperativismo entre os países signatários, facilitando o comércio global e oferecendo empréstimos para recuperar países em crise (em geral, países em desenvolvimento).
Em 1989, foi ratificado o Consenso de Washington, que passou a ser o fio condutor das ações do FMI. Tal consenso, estabelecido pelo economista neoliberal John Williamson, visava criar um conjunto de regras de atuação do FMI baseado no neoliberalismo, e seu alvo foram os países latinos em desenvolvimento, entre eles o Brasil. Para que os países conseguissem a ajuda financeira do FMI, eles deveriam aderir às regras do Consenso.
Na década de 1990, muitos economistas latino-americanos colocaram-se como céticos das regras do Consenso. De fato, hoje percebemos que a economia da Argentina afundou no fim dos anos de 1990 e que a brasileira, apesar de ter sido fortalecida com o plano real, perdeu muito por seguir a regra da privatização irrestrita, e o nosso Estado enfraqueceu-se ao deixar de investir no serviço público. A adesão ao plano do FMI aqui no Brasil deu-se durante o governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso.
A primeira e mais essencial comparação que podemos fazer entre o liberalismo e o neoliberalismo diz respeito à redução da participação do Estado na economia. Enquanto um Estado liberal não intervém na economia, um Estado neoliberal intervém muito pouco, tendo sua participação evocada apenas para a promoção de flexibilizações legais.
No entanto, existem diferenças substanciais entre o liberalismo e o neoliberalismo, e essas devem ser notadas. Para os neoliberais, os serviços básicos devem ser mantidos, mudando apenas sua forma de gestão: desconcentrando-os das mãos do Estado e concentrando-os nas mãos da iniciativa privada.
NEOLIBERALISMO E GLOBALIZAÇÃO
Denominamos globalização o fenômeno da integração financeira e cultural dos países por meio de organismos internacionais. A globalização foi intensificada a partir do século XX por conta da difusão massiva dos meios de comunicação.
O FMI, a ONU e o Banco Mundial são organismos internacionais que visam manter a política de cooperação financeira global para que haja integração entre as nações. Um problema desse fenômeno é a compressão da economia dos países em desenvolvimento pela economia dos países desenvolvidos, pois percebemos uma relação desigual, em que um tem muito mais força que o outro e, por isso, acaba garantindo seus benefícios em detrimento do mais fraco.
Outro ponto a considerar-se é a cultura nos países em desenvolvimento, que perde seu espaço para a cultura hegemônica de países como os Estados Unidos, criando-se um ambiente favorável à dominação ideológica dos países mais fracos pelos mais fortes.
NEOLIBERALISMO NA EDUCAÇÃO
Como há uma espécie de disseminação do neoliberalismo por meio do FMI e da globalização, os sistemas educativos de países em desenvolvimento têm adotado, gradativamente, ações neoliberais e seguido concepções teóricas de mesmo cunho para nortear os seus currículos. Exemplo disso são as privatizações ou terceirizações de sistemas públicos de ensino e as parcerias entre as iniciativas pública e privada para a gestão da educação.
Essas parcerias e privatizações evidenciam uma recusa dos governos a assumirem por completo o compromisso com a educação pública e passam a ideia de que a educação deve ser retirada das mãos do Estado para que ele tenha menos ônus. Nesse sentido, surgiram ONGs, como o Instituto Millenium e a Fundação Leman, que atuam como parceiras da educação oferecendo produtos e serviços para que essa possa ser alavancada.
As instituições escolares que adotam esses sistemas passam valores cultivados pela lógica neoliberal, como a meritocracia (crença de que o sucesso é resultado único e exclusivo do esforço pessoal) e a importância do empreendedorismo para as crianças na escola.
Uma crítica que pode ser feita à entrada do neoliberalismo na educação diz respeito à formação: uma educação neoliberal visa formar pessoas aptas a entrarem no competitivo mundo capitalista, enquanto uma educação libertadora, voltada para a cidadania e para a intelectualidade, necessita muito mais que ensinar estratégias, técnicas e valores neoliberais, como a meritocracia.
Aliás, se pensarmos na realidade social de nosso país (que ainda é extremamente desigual), a meritocracia sequer pode ser cogitada, pois a realidade social de um estudante de uma escola da periferia, de família de baixa renda e que, na maioria das vezes, mora em uma zona de conflitos gerados pela criminalidade, é muito mais difícil de ser vivida do que a realidade de um estudante da classe média que possui boas condições de moradia e estuda em uma escola particular.
Além do que já foi mencionado, também se pode criticar a ideia de empreendedorismo na educação quando esse é colocado como saída desejada para a solução de problemas que deveriam ser resolvidos pelo Estado. Os neoliberais defendem a diminuição estatal e, por isso, colocam no modelo de educação neoliberal a ideologia que afirma que a saída para os problemas sociais está nos indivíduos, criando termos, como o empreendedorismo social e cooperativismo, como forças capazes de suprir os déficits deixados pela falta de investimentos estatais.
NEOLIBERALISMO NO BRASIL
As medidas neoliberais começaram a ser implantadas no Brasil no governo de Fernando Henrique Cardoso, ainda na década de 1990. O presidente FHC, como também é chamado, tirou o Brasil de uma crise econômica que se estendia desde a década anterior, resultado da desastrosa política do milagre econômico, originada na Ditadura Militar. O milagre econômico visava expandir a nossa economia por meio da importação de produtos, como automóveis e eletrodomésticos. No entanto, essa política causou o endividamento massivo da população.
Por outro lado, a economia desacelerou por conta da falta de emprego e das crises institucionais geradas pelos enormes gastos do governo militar e pelos incontáveis desvios de verba e corrupção encampados por esse governo. O resultado foi uma hiperinflação que fez a moeda vigente, o cruzeiro, perder drasticamente o seu valor. Vários planos de estabilização da moeda foram tentados para solucionar a crise econômica, como o Plano Cruzado e o Cruzeiro Novo (novas moedas que passaram a circular, porém sem redução da inflação).
O Plano Real, liderado pelo sociólogo e ex-professor de sociologia da USP Fernando Henrique Cardoso, então ministro da fazenda do governo de Itamar Franco em 1993, iniciou um processo de estabilização da economia por meio da criação da moeda Real e da tomada de empréstimos do Banco Mundial e do FMI, para fazer mais dinheiro circular em nosso país. Como contrapartida, o Brasil deveria adotar as medidas propostas no Consenso de Washington. Em 1994, FHC foi eleito presidente do Brasil e iniciou o cumprimento das medidas neoliberais a todo vapor.
Os gastos estatais foram reduzidos, o Estado foi reduzido com a privatização a preço baixo de várias empresas estatais, e foram dados incentivos para que empresas estrangeiras estabelecessem novas filiais em nosso país. A economia estabilizou, porém a desualdade social ficou ainda mais evidente do que já era nos anos anteriores.
Os serviços públicos foram sucateados. Hospitais, escolas e universidades públicas deixaram de receber verbas para insumos necessários. Professores, policiais, médicos e funcionários públicos federais em geral tiveram salários atrasados e planos de progressão na carreira pública achatados. O país foi tomado por várias greves de funcionários descontentes, enquanto a população mais pobre passava fome, não tinha acesso à saúde de qualidade e não tinha o seu direito à educação respeitado. Enquanto a economia restabelecia-se, as questões sociais foram deixadas de lado.
De 2016 para cá, o nosso país vive uma nova onda neoliberal. Com o governo Temer, intensificaram-se discussões já propostas por parlamentares sobre uma reforma tributária, uma reforma da previdência, privatizações de órgãos públicos e terceirização dos serviços. Além disso, foi realizada uma reforma trabalhista que retirou alguns direitos dos trabalhadores conquistados com anos de lutas sindicais, o que evidencia uma nova guinada do neoliberalismo no Brasil.
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